quinta-feira, 12 de maio de 2011

A desmascarada tortura

A tortura, essa velha prática de flagelar as pobres vítimas, quer física, quer psicologicamente, com o objetivo de se obter submissão ou informação, não é nova. Comum entre os antigos Romanos e os Gregos, e, depois na Idade Média, particularmente ainda bem visível na Inglaterra, nos vários objetos e métodos de bárbara tortura tanto nos castelos britânicos, como o de Warwick (centro da Inglaterra), em que predomina o esticador dos membros e o içar do corpo, como em certas vilas e aldeias onde ainda se pode ver o comum cepo da cabeça e das mãos ou, para quem lê Anthony Hope, nomeadamente em obras como O Prisioneiro de Zenda, adaptado a várias versões cinematográficas, nomeadamente à máscara de ferro à qual o Rei Rudolfo V da Ruritânia, esteve sujeito por imposição do usurpador e meio irmão, Michael, durante a prisão, tudo isto é suficientemente aterrador das bárbaras práticas de antanho. Considerada legal nos casos em que era necessário obter evidência dos suspeitos, a prática da tortura era corrente entre os séculos XIV e XVIII por essa Europa fora, e inclusivamente nos casos de heresia, no seio da Igreja Católica, na chamada Inquisição, criada pelos Reis Católicos (os espanhóis Isabel e Ferdinand), em 1478, de que também a História Portuguesa é fértil.

Prática de antanho? Não! A tortura, especialmente para fins políticos, é tema bem atual, particularmente na Grã-Bretanha. Esqueçamos, caso isso seja possível, as horríveis cenas praticadas pelos militares americanos na prisão de Abhu Graid, no Iraque, ou as que foram denunciadas pela WikiLeaks, em 400 mil documentos, em 22 de Outubro último, em que, entre 2003 e 2009, pelo menos 104 mil pessoas foram sistematicamente mortas, entre as quais mais de 60 mil civis e a predominante e selvática tortura praticada pelas forças iraquianas, treinadas pelos americanos que fechavam os olhos a semelhante prática, que compreensivelmente tanto furor provocaram em todo o mundo. Concentremo-nos, porém, noutro horrível exemplo, desta vez na controversa prisão americana na Base de Guantânamo, em Cuba. Este, particularmente o caso do cidadão etíope, mas residente na Inglaterra desde 1994, Binyam Mohamed, que acusou os serviços secretos britânicos, MI5/MI6, de conluirem com os colegas americanos no interrogatório e tortura a que afirma ter sido submetido, primeiro no Afeganistão e, em seguida, em Guantânamo. Mas não só ele, outros 15 detidos, cidadãos de ou residentes na Grã-Bretanha, ganharam o caso, com elevadas indemnizações arrancadas ao governo britânico, entre 6 e 12 milhões de euros, que a conselho dos serviços secretos preferiu esta solução em vez de ter de divulgar publicamente, em tribunal, factos desagradáveis do seu alegado envolvimento. (Aiás, este, e qualquer envolvimento, foi desmentido pelo chefe dos Serviços de Segurança MI6, Sir John Sawers, bem como pelos colegas de MI5). Inicial e furiosamente negado, competiu ao juiz do Tribunal Supremo, Lorde Judge, baseado em evidência apresentada em tribunais americanos, concluír que, efetivamente, as “autoridades britânicas” tinham estado “envolvidas e até facilitado os maus tratos e a tortura” aquando Binyam esteve detido pelas autoridades americanas. Furor! Mas há mais! O clamor recrudesceu, não pelo facto da conclusão jurídica, mas sim pela intervenção do governo em solicitar a não divulgação das provas. Coube a outro Juiz, Lorde Neuberger, denunciar a inaceitável tentativa, mas pior, acusar o governo de “deliberadamente enganar” o Parlamento no que classificou de “hábito de supressão”. E, se isto não bastasse, surgem novas acusações, em que o Exército Britânico é o visado, durante a sua permanência em Bassorá, no sul do Iraque, em que várias vítimas civis foram objeto de inaceitável tratamento, cujos casos decorrem atualmente em tribunais britânicos. É extremamente invulgar na sociedade britânica questões desta natureza. Os tribunais procuram ciosamente guardar e manter a sua multi-secular independência de qualquer Executivo. Por isso, compreende-se a sua reação. O que, porém, não dignifica é a pretensão oficial das autoridades britânicas, e muito particularmente os seus Serviços Secretos, em negarem a existência de/ou envolvimento em tão condenável prática!

NOTA. DEVIDO A LONGA AUSÊNCIA, ESTE ESPAÇO VAI FICAR DESATUALIZADO ATÉ MEADOS DE SETEMBRO, REGRESSANDO COM MAIOR VIGOR E INSPIRAÇÃO. O DEVIDO PEDIDO DE DESCULPA E COMPREENSÃO A TODO(A)S O(A)S AMÁVEIS E DEDICADO(A)S LEITORE(A)S.

sábado, 7 de maio de 2011

COLIGAÇÃO DESCOLIGADA?

As eleições regionais e autárquicas, realizadas na quinta-feira 5 de Maio, mas principalmente o referendo sobre a alteração constitucional, o primeiro desde a saída ou não do Mercado Comum, em 1975, foram reveladores. Se no último, promessa resultante da coligação, resultou, largamente, na inalterável posição atual, nas primeiras, a grande surpresa foi a obtenção da maioria absoluta do partido nacionalista escocês, SNP. Isto significa que, possivelmente daqui a dois anos realizar-se-à o há muito prometido referendo para a secessão da Escócia do Reino Unido, possibilidade que será fortemente resistida pelo governo central de Westminster, seja qual for o partido no poder. Quanto ao referendo, e nas eleições autárquicas, a forte derrota dos Liberais-Democratas, ainda que as promessas de que não afetarão a coligação, os efeitos, especialmente devido à posição assumida pelos Conservadores, que os Liberais Democratas acusam de desleais, as verdadeiras consequências só o tempo revelará.

O atual governo britânico, coligado entre Conservadores e Liberais Democratas (Lib Dems), desde Maio do ano passado, o primeiro do género desde o início do século, não obstante os desafios, nomeadamente o aumento dos impostos e drásticas reduções na economia, elevado aumento das propinas universitárias, às quais os chamados Lib-Dems tinham prometido abolir durante a campanha eleitoral, que lhes custou o opróbrio dos seus adeptos e simpatizantes pelo incumprimento da promessa, e várias e numerosas manifestações, algumas delas violentas, tem funcionado relativamente bem como coligação governamental. Porém como cada partido procura manter a sua independência fora do governo, o que tem acontecido em eleições parciais, e agora nas autárquicas e no referendo, em que cada um disputa o seu próprio espaço.

Esclareça-se que o sistema eleitoral britânico não é idêntico ao nosso ou de outros países europeus, ou seja o método proporcional Hont. Foi sempre um sistema uninominal, e não por bloco partidário, como é o nosso caso. Denominado “Past the Post”, ou seja o candidato com o maior número de votos num determinado circulo, é vitorioso. Embora meio utilizado com grande sucesso nos últimos 90 anos na Austrália e, ironicamente, há muito em eleições sindicais, de organizações de caridade e das igrejas do país, este sistema é combatido pelos partidos minoritários, como é o caso dos Lib Dems, o maior dos desta categoria, que assim não conseguem eleger os seus candidatos, calhando normalmente, a maior fatia para os dois partidos principais – Labour e Conservadores - que geralmente mantêm a alternância do poder. Uma das condições dos Lib Dems aquando da formação da coligação, foi propôr e – obter – a realização de um referendo a fim de se alterar o sistema. Porém, e enquanto preferia o sistema proporcional, ou Hont, como no nosso caso, os Conservadores, obviamente contra qualquer reforma do sistema antigo que lhes dá vantagem, propuseram uma alternativa - o sistema de Voto Alternativo, que os Lib Dems não tiveram alternativa que aceitar. Trata.se de um método em que o candidato, para ser vencedor, tem de obter o mínimo de 50% da totalidade dos votos. Da lista eleitoral do círculo, o eleitor opta pela 1ª, 2ª e 3ª escolha. Na contagem final, o resultado do candidato com o menor número de votos é desclassificado, transitando o resultado para o candidato mais favorecido até que obtenha os desejados 50% para ser o virtual vencedor. Entendido, caro(a) leitor(a)? Complicado? Sem dúvida! Por isso foi recusado pelo eleitorado.